Proximidade, carisma e honestidade. Argumentos utilizados em 2002 para justificar o voto em Luiz Inácio Lula da Silva , hoje fundamenta a escolha de muitos eleitores de Jair Bolsonaro para a presidência da república. Mas se no passado a figura de uma liderança carismática possibilitou a vitória nas urnas do Partido dos Trabalhadores (PT), hoje ela também representa a ameaça da alçada ao poder de um candidato de extrema direita com encanto peculiar.
Ao passo que o cenário político instável favorece os discursos autoritários, a insatisfação com políticos acentua a proliferação de propostas simples para problemas complexos. Trata-se de um cenário fértil para que discursos odiosos sejam utilizados como arma política por candidatos, visto o apoio às declarações controversas do “carismático” Jair Bolsonaro quando diz que é “preconceituoso, com muito orgulho”, que o erro da ditadura militar foi “torturar e não matar” e que ainda afirmou à uma colega da Câmara dos Deputados: “não te estupro porque você não merece”
O cenário que possibilitou a ascensão do ‘bolsonarismo’
Alguns aspectos conjunturais e estruturais explicam, segundo a socióloga da Unifesp, o que pode se chamar de “onda neoconservadora, alt-right, ‘nova direita’ ou crescimento da extrema direita”, simbolizada, em grande medida, pela figura de Jair Bolsonaro. Entre eles, podemos citar a desconfiança generalizada na política, o antipetismo e o medo da violência e da criminalidade, temas que veremos a seguir:
A desconfiança na política e nos partidos – A desorganização política advinda do golpe de 2016 é, para a autora, um dos elementos que possibilitou a ascensão política de Bolsonaro nos últimos anos, na medida em que “fragilizou intensamente a ordem democrática e acelerou processos de decomposição política”.
Segundo a autora, “a anomia política instaura-se no cotidiano, levando a uma degradação muito rápida e a uma perda de confiança das bases representativas da sociedade brasileira”.
Exerce papel importante, nesse sentido, a atuação da Operação Lava Jato que, por meio de uma “justiça penal do espetáculo”, colaborou para a imagem do político corrupto e ajudou na popularização da visão de que os termos “político” e “corrupto” são quase sinônimos entre si.
Para os eleitores de Bolsonaro entrevistados por Esther Solano, ele é “o único, ou um dos únicos políticos honestos do Brasil”. Para eles, não importa se um candidato é de esquerda ou de direita pois, para eles, os políticos se preocupam com “somente seu próprio benefício e interesse”.
Bolsonaro não é corrupto e é diferente dos partidos que estão aí. PT e PSDB são a mesma coisa. No Brasil só existe o poder e o dinheiro. Olha a Lava Jato, no Congresso eles são do contra, mas na corrupção estão de mãos dadas. Bolsonaro é diferente porque não é corrupto. (Entrevistado D).
As denúncias de corrupção contra ele, não abalam seu eleitorado:
A imprensa quer acabar com ele porque sabem que é muito forte. Ninguém segura. Vão fazer de tudo para acabar com ele, mas a gente sabe que ele é honesto. (Entrevistada E)
O crescimento do antipetismo – Grupos populistas de direita, como o Movimento Brasil Livre (MBL), Vem pra Rua e os próprios seguidores de Bolsonaro construíram, segundo Esther Solano, grande parte de sua popularidade sobre a narrativa de que o PT seria “o partido mais corrupto do país”.
Vários dos eleitores de Bolsonaro admitiram, durante as entrevistas, ter votado no PT nos dois primeiros mandatos. O argumento é de que “Lula estava perto do povo, era carismático, alguém diferente dos políticos de sempre e era honesto”.
Atualmente, esses candidatos adotam um forte discurso antipetista, ancorado na retórica anticorrupção e na rejeição de políticas de redistribuição de renda das quais, segundo Solano, alguns inclusive foram beneficiados. Os mesmos argumentos de “proximidade, carisma e honestidade” que justificaram votos em Lula em 2002 e 2006, hoje servem para justificar o voto em Bolsonaro.
Sobre isso, a entrevistada M. declara:
Eu votei no Lula as duas vezes. Ele é um líder. Reconheço isso. Fez coisas importantes, não dá para negar. Eu votei nele mais porque parecia um cara diferente, era um cara do povo, não sei, parecia boa gente, mas no final ele mostrou que é como todos, um ladrão. Por isso agora voto no Bolsonaro porque ele sim, ele é diferente.
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