INTRODUÇÃO
Ao lermos a Bíblia, especialmente na sua primeira parte, o Velho Testamento, encontramos muitas estipulações a respeito de dietas alimentares. Deus indicou uma lista de alimentos (Lv 11; Dt 14.3-20, etc) que o seu povo, os israelitas, deveriam abster-se. Devemos lembrar que antes mesmo da lei ser dada a Israel, Deus nos dias de Noé já havia feito separação entre animais ‘impuros e puros’ (Gn 7.2).
Por quais motivos encontramos Deus proibindo certos tipos de alimentos, do mundo animal, ao seu povo? A principal explicação dada é que tais animais poderiam ter um potencial de doenças, bactérias, etc. Outra razão apresentada é que alguns desses comiam presas com sangue, e eram carniceiros, ambas as coisas proibidas por Deus (Gn 9.4; Lv 5.2)1. Essas razões, porém, não podem ser verificadas na Bíblia. Deus não disse por quais motivos ele considerou aquelas animais imundos. A razão não foi claramenterevelada. Essa resposta não temos (Dt 29.29). Só temos a determinação de Deus, de que tais eram impuros:
“Esta é a lei dos animais, e das aves, e de toda criatura vivente que se move nas águas, e de toda criatura que se arrasta sobre a terra;Para fazer diferença entre o imundo e o limpo; e entre animais que se podem comer e os animais que não se podem comer.” Levítico 11:46,47
I. COMO COMPREENDER A LEI DE DEUS A RESPEITO DO ASSUNTO?
Na perspectiva protestante, corretamente interpretando a Bíblia, cremos que a Lei de Deus tem três facetas:
III. Além dessa lei, geralmente chamada lei moral, foi Deus servido dar ao seu povo de Israel, considerado uma igreja sob a sua tutela, leis cerimoniais que contêm diversas ordenanças típicas. Essas leis, que em parte se referem ao culto e prefiguram Cristo, as suas graças, os seus atos, os seus sofrimentos e os seus benefícios, e em parte representam várias instruções de deveres morais, estão todas ab-rogadas sob o Novo Testamento. Heb.10:1; Gal. 4:1-3; Col. 2:17; Exo. 12:14; I Cor.5:7; II Cor. 6:17; Col. 2:14, 16-17; Ef. 2:15-16.
IV. A esse mesmo povo, considerado como um corpo político, Deus deu leis civis que terminaram com aquela nacionalidade, e que agora não obrigam além do que exige a sua eqüidade geral.Exo. 21, e 22:1-29; Gen. 49:10; Mat. 5:38-39.
V. A lei moral obriga para sempre a todos a prestar-lhe obediência, tanto as pessoas justificadas como as outras, e isto não somente quanto à matéria nela contida, mas também pelo respeito à autoridade de Deus, o Criador, que a deu. Cristo, no Evangelho, não desfaz de modo algum esta obrigação, antes a confirma.I João 2:3-4, 7; Rom. 3:31; Tiago, 2:8, 10, 11; Rom-. 3:19- Mat. 5:18-19.”2
Portanto, a Lei de Deus é moral, cerimonial e civil. E um exame bíblico mais ponderado, pode nos indicar quais leis do VT são de cada uma dessas classes.
II. AS PROIBIÇÕES CONTINUAM AOS CRISTÃOS?
Com a vinda de Cristo, como mencionado na citação acima, algumas leis foram modificadas, outras foram expandidas, e ainda outras, cumpridas (= abolidas). Mas não são os cristãos que devem dizer quais continuam ou não. Foi Deus que ao inspirar os autores do Novo Testamento deu os indicativos diretos e indiretos de quais conclusões devemos adotar. Leiamos alguns textos do Novo Testamento, para deixarmos o próprio Deus falar. Observe as partes que destaquei em negrito:
1. “Estando com fome, quis comer; mas, enquanto lhe preparavam a comida, sobreveio-lhe um êxtase; então, viu o céu aberto e descendo um objeto como se fosse um grande lençol, o qual era baixado à terra pelas quatro pontas, contendo toda sorte de quadrúpedes, répteis da terra e aves do céu. E ouviu-se uma voz que se dirigia a ele: Levanta-te, Pedro! Mata e come. Mas Pedro replicou:De modo nenhum, Senhor! Porque jamais comi coisa alguma comum e imunda. Segunda vez, a voz lhe falou: Ao que Deus purificou não consideres comum.”(Atos 10. 10-15).
No caso acima, Deus revelou a Pedro que os gentios (os não judeus) não eram mais para serem excluídos da mensagem. Para isso, Deus usou a questão de alimentos puros e impuros nessa visão a Pedro. Caso não fosse próprio, Deus certamente não usaria um ato pecaminoso para ilustrar a graça aos gentios.
2. “Acolhei ao que é débil na fé, não, porém, para discutir opiniões. Um crê que de tudo pode comer, mas o débil come legumes; quem come não despreze o que não come; e o que não come não julgue o que come, porque Deus o acolheu. Quem és tu que julgas o servo alheio? Para o seu próprio senhor está em pé ou cai; mas estará em pé, porque o Senhor é poderoso para o suster. Um faz diferença entre dia e dia; outro julga iguais todos os dias. Cada um tenha opinião bem definida em sua própria mente. Quem distingue entre dia e dia para o Senhor o faz; e quem come para o Senhor come, porque dá graças a Deus; e quem não come para o Senhor não come e dá graças a Deus. Porque nenhum de nós vive para si mesmo, nem morre para si. Porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos. Quer, pois, vivamos ou morramos, somos do Senhor. Foi precisamente para esse fim que Cristo morreu e ressurgiu: para ser Senhor tanto de mortos como de vivos. Tu, porém, por que julgas teu irmão? E tu, por que desprezas o teu? Pois todos compareceremos perante o tribunal de Deus. Como está escrito: Por minha vida, diz o Senhor, diante de mim se dobrará todo joelho, e toda língua dará louvores a Deus. Assim, pois, cada um de nós dará contas de si mesmo a Deus. Não nos julguemos mais uns aos outros; pelo contrário, tomai o propósito de não pordes tropeço ou escândalo ao vosso irmão. Eu sei e estou persuadido, no Senhor Jesus, de que nenhuma coisa é de si mesma impura, salvo para aquele que assim a considera; para esse é impura. Se, por causa de comida, o teu irmão se entristece, já não andas segundo o amor fraternal. Por causa da tua comida, não faças perecer aquele a favor de quem Cristo morreu. Não seja, pois, vituperado o vosso bem. Porque o reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo. Aquele que deste modo serve a Cristo é agradável a Deus e aprovado pelos homens. Assim, pois, seguimos as coisas da paz e também as da edificação de uns para com os outros. Não destruas a obra de Deus por causa da comida. Todas as coisas, na verdade, são limpas, mas é mau para o homem o comer com escândalo.É bom não comer carne, nem beber vinho, nem fazer qualquer outra coisa com que teu irmão venha a tropeçar ou se ofender ou se enfraquecer. A fé que tens, tem-na para ti mesmo perante Deus. Bem-aventurado é aquele que não se condena naquilo que aprova. Mas aquele que tem dúvidas é condenado se comer, porque o que faz não provém de fé; e tudo o que não provém de fé é pecado.” (Romanos 14).
O famoso comentarista bíblico, Matthew Henry, explica a respeito de um versículo dessa passagem:
3. “Proibindo o casamento e ordenando a abstinência dos manjares que Deus criou para os fiéis e para os que conhecem a verdade, a fim de usarem deles com ações de graças; porque toda criatura de Deus é boa, e não há nada que rejeitar, sendo recebido com ações de graças, porque, pela palavra de Deus e pela oração, é santificada.”(I Tim. 4.3-5).
Por fim, um texto bíblico que bem conclusivo para o debate, especialmente a respeito de acusações que alguns seguidores das leis dietéticas do Velho Testamento constantemente lançam sobre os cristãos. A passagem é muito clara, e deixa os cristãos livres de acusações:
4. “Portanto, ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa dos dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados,Que são sombras das coisas futuras, mas o corpo é de Cristo.” (Colossenses 2:16,17).
Sobre esse texto, a Bíblia de Estudo NVI comenta:
“As leis cerimoniais do AT são apresentadas aqui como sombras (cf. Hb 8.5; 10.1) por retratarem simbolicamente a vinda de Cristo; por isso, qualquer insistência na observância dessas cerimônias deixa de reconhecer o fato de que já foram cumpridas em Cristo.”4
Talvez alguém possa perguntar: “Se os alimentos impuros eram cerimoniais, e como tal, foi abolido em Cristo, como não comer alimentos impuros representava a vinda de Cristo?”
Minha resposta: Com base na visão dada a Pedro (Atos 10), a distinção visava demonstrar a rejeição dos gentios fora de Israel, não sendo antigamente incluídos na aliança. É o que temos revelado na Escritura:
“Mas agora em Cristo Jesus, vós, que antes estáveis longe, já pelo sangue de Cristo chegastes perto.Porque ele é a nossa paz, o qual de ambos os povos fez um; e,derrubando a parede de separação que estava no meio,Na sua carne desfez a inimizade, isto é, a lei dos mandamentos, que consistia em ordenanças, para criar em si mesmo dos dois um novo homem, fazendo a paz,E pela cruz reconciliar ambos com Deus em um corpo, matando com ela as inimizades.” (Efésios 2:13-16).
NOTAS
1.Bíblia de Estudo Genebra, Edição Revista e Ampliada, p. 160.
2. Confissão de Fé de Westminster, Capítulo XIX.
3. Bíblia de Estudo Matthew Henry, p. 1844.
4. p. 2044.

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