Se é verdade que uma imagem vale por mil palavras, na política a falta delas vale o mesmo tanto ou, a depender das circunstâncias, até muito mais do que isso. A ausência dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, do PT, das cabines de votação no segundo turno das eleições em seus respectivos domicílios eleitorais, ontem, mostrou mais do que o fim do protagonismo do partido de ambos no cenário político nacional, como bem assinalou, em entrevista, o cientista político e professor do Insper Carlos Melo.
Sem ocultar sua surpresa com as abstenções ilustres, Melo foi além.
Sem ocultar sua surpresa com as abstenções ilustres, Melo foi além.
Declarou que a postura dos dois ex-presidentes da República é “uma constatação de que o PT passou, de que não é mais protagonista e de que seus principais personagens não têm mais o que dizer”. E acrescentou: “É um protesto ou uma rendição? A história é que vai responder”. Lembrando da luta pela democracia tanto de Lula, durante as Diretas Já, quanto de Dilma, no período de governos militares, o cientista político ressalvou que não votar é um direito político.
Mas advertiu que o fato de serem ex-presidentes é simbólico. “É até irônico que eles fiquem, de certo modo, escondidos hoje em suas casas”, afirmou. Melo também lembrou que os dois líderes petistas correriam o risco de serem hostilizados caso comparecessem a seus colégios eleitorais e, para finalizar, acrescentou considerar que o PT vive um momento melancólico. A bem da verdade, não havia representantes políticos do PT nas duas cidades em que os petistas deveriam ter votado ontem, Lula, no ABC, berço do petismo onde o partido foi varrido do mapa, e Dilma, em Porto Alegre.
Valendo-se de seus 71 anos, o petista aproveitou-se da prerrogativa do voto facultativo para não participar do processo eleitoral. Já Dilma estava visitando a mãe em Belo Horizonte. Como se vê, justificativas não faltaram aos dois. O fato é que, como analisou o professor, o simbolismo de suas ausências é muito forte para ser simplesmente desconsiderado. Lula foi até o desfecho trágico da gestão petista na Presidência da República, com seu macabro legado administrativo e econômico, um ícone da democracia no país.
Como o momento mais nobre e valioso do processo democrático é o voto, o desprezo ao ato de votar, num país em que ele é obrigatório, não deixa de soar também como uma agressão à carga de institucionalidade que possui. A leitura poderia ser aplicada da mesma forma à ex-presidente Dilma Rousseff, uma criatura de Lula, é verdade, mas que, até ser afastada da presidência, meses atrás, representou política e administrativamente o Brasil. Será que os dois nunca acreditaram, de fato, na democracia? Como antecipou o professor, só a história irá responder.
* Artigo publicado originalmente no jornal Tribuna da Bahia
Raul Monteiro*
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