O fraco e o forte na fé - Se Liga na Informação





O fraco e o forte na fé

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EM ROMANOS 14, PAULO PARECE TER DITO QUE O QUE COMEMOS (V. 1-4) E O DIA QUE GUARDAMOS (V. 5 E 6) NÃO FAZEM NENHUMA DIFERENÇA. SERIAM APENAS QUESTÕES DE MATURIDADE ESPIRITUAL? (ADRIANA CORDEIRO)
Antes de mais nada, temos que entender o problema na igreja de Roma. O pano de fundo da epístola eram as sérias difi culdades de relacionamento que estavam ocorrendo entre os membros de origem judaica e gentílica. Um grupo estava acusando o outro de heresia ou frouxidão quanto à alimentação e observância de dias.


O problema alimentar parece ter sido o mesmo de Corinto, em cujo contexto o “forte” e o “fraco” também são mencionados (1Co 8:1-13; 10:14-33). A questão tinha que ver com o consumo de carnes sacrifi cadas a ídolos, prática comum entre os pagãos. Depois que os animais eram sacrifi cados, a carne era consumida em alguma festa no próprio templo ou então levada para ser vendida no mercado. Cristãos mais escrupulosos achavam que quem comesse essa carne estaria participando da idolatria. Outros, inclusive o próprio Paulo, que sabiam que o ídolo em si nada é e que não tem como contaminar a carne, não viam problema algum no consumo, a menos que isso pudesse gerar algum escândalo.
As orientações dietéticas de Levítico 11 não eram cerimoniais, visto que não estavam relacionadas aos serviços do santuário nem eram regidas por leis rituais
Não é correto, portanto, empregar a recomendação de Paulo quanto a essa situação específica para argumentar que a distinção entre animais puros e imundos de Levítico 11 não mais seja válida.
Não era disso que o apóstolo estava falando. A distinção de animais de Levítico 11 é anterior ao estabelecimento do concerto no monte Sinai; na verdade, é anterior ao dilúvio (Gn 7:2) e, portanto, universal, ou seja, não restrita ao povo de Israel. Além disso, ela não é de natureza cerimonial, visto que não era governada por leis rituais nem estava relacionada a qualquer dos serviços do santuário. Logo, essa distinção não pode haver sido abolida pela cruz.
Quanto à observância de dias, o princípio da analogia da Escritura também impede que a referência seja ao sábado semanal, cuja guarda é prevista nos Dez Mandamentos e remonta à criação (Gn 2:1-3), sendo, portanto, também anterior ao concerto entre Deus e Israel no Sinai (veja Êx 16). A propósito, há mais referências aos Dez Mandamentos no Novo Testamento que no Antigo, inclusive pelo próprio Paulo, que os cita em Romanos 13:9 e claramente alude a eles em 1 Timóteo 1:8-10. Quanto ao sábado em particular, o relato de Atos 16:11-18 demonstra que
esse era o dia de guarda de Paulo. O apóstolo não ia às sinagogas aos sábados apenas para testemunhar aos judeus (veja At 13:14, 42, 44; 17:2; 18:4), como se alega com frequência. Em Filipos, parece que não havia sinagoga, mas mesmo assim Paulo buscou junto à natureza um lugar em que pudesse adorar a Deus.
Os dias que estavam dividindo judeus e gentios na igreja de Roma tinham que ver com os muitos dias do calendário cerimonial judaico mencionados em Levítico 23, vários dos quais funcionavam como sábados e nos quais os judeus descansavam de seus trabalhos, embora fossem distintos do sábado do sétimo dia em diversos aspectos. Eles não estavam previstos nos Dez Mandamentos e sua observância não era semanal, mas anual – ou mensal, no caso da lua
nova. Eram cerimoniais por natureza.
O ponto central em Romanos 14, portanto, é que o consumo de carnes sacrifi cadas a ídolos e a celebração das festividades cerimoniais judaicas não deviam ser motivo de separação e contenda entre os cristãos judeus e não judeus de Roma. Um grupo não deveria desprezar nem julgar o outro por divergências quanto a essas questões menores, nem servir de consciência para o outro. Na igreja, sempre teremos “fortes” e “fracos”, e o ideal divino é que aprendamos a tolerância mútua, pois todos fomos igualmente salvos pela graça de Cristo (v. 8-12).

WILSON PAROSCHI, doutor em Teologia, com especialização em Novo Testamento, é professor no Unasp, campus Engenheiro Coelho (SP). Revista Adventista 11/2015

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