Escola Bíblica Dominical: Eleição e Predestinação - Se Liga na Informação





Escola Bíblica Dominical: Eleição e Predestinação

Compartilhar isso

Texto Áureo
"Como também nos elegeu nele antes da fundação do mundo, para que fôssemos santos e irrepreensíveis diante dele em amor, e nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplácito de sua vontade."
(Ef 1.4,5)

Verdade Prática
Segundo a sua presciência, Deus elegeu e predestinou para a salvação os que creriam e perseverariam na fé em Cristo Jesus.


                                         CAPÍTULO 3

Eleição e Predestinação

“Como também nos elegeu nele antes da fundação do mundo, para que fôssemos santos e irrepreensíveis diante dele em amor, e nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplácito de sua vontade”
 (Ef 1.3-4).

Eleição e predestinação são termos importantes na compreensão da doutrina da salvação. Esses termos às vezes são usados por alguns teólogos de modo intercambiável. Em contrapartida, a maioria dos intérpretes arminianos faz distinção entre os termos. O teólogo pentecostal Severino Pedro da Silva avalia que a eleição e a predestinação “segue quase que paralelamente os mesmos ditames [...] e que alguns já chegaram até a sugerir que uma é a consequência da outra”. De qualquer modo, esses vocábulos ligados entre si elucidam o plano divino de salvar os pecadores. Um equívoco bem comum é confundir essas palavras como sinônimas. Além disso, essas expressões têm provocado divergências entre pelagianos, semipelagianos, arminianos e calvinistas , especialmente no campo da “mecânica da salvação”.44

 Nesse aspecto da controvérsia, sumariamente se pode catalogar quatro visões soteriológicas: (1) os pelagianos, que afirmam ser o homem o único agente da salvação; (2) os semipelagianos, que defendem ser o homem aquele que dá início ao processo da salvação e que Deus responde ao homem; (3) os arminianos, que ensinam ser Deus quem inicia o processo da salvação e que o homem responde a Deus; e (4) os calvinistas, que argumentam ser Deus o único agente na salvação, predestinando uns para serem salvos e outros à condenação. Nesse capítulo, abordaremos os conceitos bíblicos e a posição pentecostal referente a esses pontos.

I. ELEITOS EM CRISTO

1            1 .     A Eleição divina


Paulo faz uso de dois termos que revelam a soberana vontade divina: “como também nos elegeu [...] e nos predestinou” (1.4-5). A expressão eleição significa “escolha”, e predestinação tem o sentido de “determinar antes”. Esses vocábulos ligados entre si explicam que, pela presciência divina, Deus soube quem iria crer e perseverar em Cristo desde a eternidade e elegeu-os conforme a sua vontade e, para esses eleitos, determinou propósitos específicos (1 Pe 1.2). O teólogo arminiano Henry Clarence Thiessen menciona três pontos importantes dessa doutrina bíblica da eleição divina:

Primeiramente, a eleição é um “ato soberano de Deus em graça”. Deus não tem a obrigação de escolher ninguém, visto que todos são igualmente pecadores, merecendo assim a condenação. Em segundo lugar [...], a eleição é Cristocêntrica
— “pelo qual escolheu em Jesus Cristo”. A eleição do indivíduo ocorre somente em união com Jesus Cristo pela fé. Não existe eleição fora de Cristo […] a eleição contempla “aqueles que de antemão sabia que O aceitariam”. A compreensão da relação entre a eleição e a presciência de Deus é sumamente importante para o entendimento adequado da doutrina.45

 Essa conceituação fundamenta-se nas Escrituras Sagradas, e tal interpretação foi defendida por grande parcela dos Pais da Igreja e, no período da Reforma Protestante, foi sustentada por Jacó Armínio e boa parcela dos primeiros reformadores do século XVI. Mais tarde, em 1619, essa compreensão foi condenada pelos calvinistas por ocasião do Sínodo de Dort. E, apesar de a interpretação de Armínio ter sido ferozmente combatida pelo calvinismo, atualmente cerca de 80% dos evangélicos são de confissão soteriológica arminiana.

 Esse entendimento da maioria dos cristãos também é a compreensão do pentecostalismo clássico. Além disso, o conceito de eleição entre os pentecostais “inclui a previsão de Deus quanto àquilo que o homem irá fazer com a sua própria liberdade, mas depende, para sua realização, da graça soberana de Deus”. Nesse sentido, não há nenhum conflito entre a soberania de Deus e a liberdade humana. Outro detalhe a ser considerado na eleição é o seu aspecto corporativo, que inclui os indivíduos em associação com o corpo de Cristo, a Igreja. Eis a posição da Declaração de Fé das Assembleias de Deus:

Deus elegeu a Igreja desde a eternidade, antes da fundação do mundo [Ef 1.4], segundo a sua presciência [1 Pe 1.2; 2 Ts 2.13]. O Senhor estabeleceu um plano de salvação para toda a humanidade [...] (Tt 1; 2); pois essa é a sua vontade [1 Tm 2.3- 4]. Assim como Deus não elegeu uma nação já existente, mas preferiu criar uma nova a partir do patriarca Abraão [Gn 12.2], o Senhor Jesus Cristo, da mesma forma, criou um novo povo formado por judeus e gentios (Ef 2.14 [ 1 Co 12.13]).

Esse enunciado atesta que a eleição é corporativa. Significa que a eleição em Cristo é, primeiramente, coletiva, ou seja, trata-se da eleição de um povo, a Igreja (1.4,5,7,9; 1 Pe 1.1; 2.9). Efésios menciona a eleição no plural: “nos elegeu” (1.4). Em toda a Epístola, os eleitos são tratados em conjunto: um corpo (1.23), um povo (2.14), uma família (2.19), um edifício (2.20-22) e a Igreja (3.10, 5.23ss). A Epístola assinala que Deus elegeu de antemão um conjunto de pessoas para a salvação, a Igreja. Nesse caso, “o foco da eleição não é o indivíduo, mas o grupo, o corpo, a Igreja, formada por todos aqueles que creram em Cristo e permanecerão até o fim”.

 Desse modo, ratifica-se que a eleição é corporativa (coletiva) e também cristocêntrica — pois somente “é eleito” quem estiver em Cristo. Esse também é o parecer de Donald Stamps, editor geral da Bíblia de Estudo Pentecostal: “[...] a eleição é coletiva e abrange o ser humano como indivíduo, somente à medida que este se identifica e se une ao corpo de Cristo, a igreja verdadeira”.54

2. As condições da eleição

 Deus oferece a salvação para todos, pois “quer que todos os homens se salvem, e venham ao conhecimento da verdade” (1 Tm 2.4). Essa doutrina é conhecida como “expiação ilimitada”, também chamada de “expiação universal qualificada”. Trata-se de uma das doutrinas mais claras de toda a Bíblia Sagrada. É a resposta para a pergunta: “Por quem Jesus Cristo morreu? Somente por alguns poucos ou pelos pecadores do mundo todo?”.

A declaração arminiana afirma que “Cristo, o Salvador do mundo, morreu por todos e por cada um dos homens, de modo que obteve reconciliação e remissão dos pecados por sua morte na cruz, porém, ninguém é realmente feito participante dessa remissão, exceto os crentes”.55 Esse entendimento equivale acreditar na revelação contida na Bíblia Sagrada, isto é, que Deus amou o mundo e enviou o seu Filho “para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16). A Declaração de Fé das Assembleias de Deus corrobora com esse ensino bíblico:

Por isso, o Pai enviou o seu amado Filho Jesus Cristo [1 Jo 4.9] para morrer em nosso lugar [1 Co 5.7], providenciando- nos uma salvação eterna, completa e eficaz [Hb 5.9]. O Evangelho contempla a todos e a ninguém exclui: “Porque a graça de Deus se há manifestado, trazendo salvação a todos os homens” (Tt 2.11). Por conseguinte, a salvação está disponível a todos os que creem [Jo 3.15-16]. Sim, todos nós, sem exceção, podemos ser salvos através dos méritos de Jesus Cristo, pois todos nós fomos criados à imagem de Deus.56


 A doutrina calvinista, no entanto, discorda que Cristo morreu por todos. Para os seguidores de Calvino, “a expiação é limitada”, ou seja, Cristo morreu somente por alguns — apenas para os eleitos. Nessa visão, o sacrifício de Cristo é diminuído, e o calvário torna-se mera formalidade, uma vez que a salvação não está disponível a todos. A partir desse pressuposto, os calvinistas defendem que a eleição é “incondicional”. Conforme Calvino asseverou, significa acreditar que Deus elegeu uns para a salvação e outros para a perdição.

 Contrariando esse ensino calvinista, a Bíblia Sagrada apresenta cerca de 80 textos comprobatórios que apontam para a “expiação ilimitada” — a morte de Cristo em favor da salvação de todos os homens, e não somente para alguns (Is 53.6; Mt 11.28-30; 18.14; Jo 1.7; 1.29; 3.16,17; 6.51; 12.47; Rm 3,23-24; 5.6; 5.15; 10.13; 1 Tm 2.3-6; 4.10; Tt 2.11; Hb 2.9; 2 Pe 3.9; 1 Jo 2.2; 4.14, etc.). Outro aspecto doutrinário refere-se ao ensino em que a eleição para salvação é “condicional”, e não “incondicional”. Eleição condicional significa que Deus escolhe por meio das condições que Ele próprio estabeleceu. Por isso, são eleitos somente aqueles que preenchem essas condições, e não de um modo arbitrário (incondicional). John Wesley (1703–1791), pregador anglicano, discordava do sistema calvinista, que transformava a eleição do Deus de amor em eleição de um Deus tirano e insensível para com os pecadores.

 O ensino arminiano explica, como já dito, que, “por meio da presciência divina, Deus sabe, desde a eternidade, quais indivíduos creriam e perseverariam na fé, e a essas pessoas Deus elegeu”.58 Isso, portanto, não implica entender como Calvino, ou seja, que Deus tenha elegido uns para a vida e outros para danação, porque, segundo as Escrituras, Ele não quer “que alguns se percam, senão que todos venham a arrepender-se” (2 Pe 3.9). Desse modo, ratifica-se que tanto a expiação ilimitada como a eleição condicional foram estabelecidas pelo próprio Deus.

Assim, a condição mais elementar para a salvação é estar em Cristo (Ef 1.1-4). Isso implica em ratificar que a eleição é cristocêntrica, isto é, ninguém é eleito sem estar unido a Cristo. A eleição torna-se uma realidade para cada pessoa consoante o seu prévio arrependimento e fé (2.8; 3.17).  Entretanto, esse meio não é meritório, e ninguém pode cumpri-lo sem a graça de Deus. Desse modo, fomos eleitos por iniciativa divina por causa da graciosa obra de Cristo, e não pelas nossas obras (2.8-9).

3. Vida santa e irrepreensível

Paulo primeiramente enfatiza que a finalidade da eleição é propiciar uma vida nova aos eleitos, isto é, para sermos “santos e irrepreensíveis diante dEle” (Ef 1.4b). O vocábulo grego hagios (santo), no aspecto espiritual, significa “separado do pecado” (1 Pe 1.15-16). O adjetivo grego amõmos (irrepreensível) expressa algo “sem defeito” ou “inculpável” (Fp 2.15). Os termos apontam para a santificação, isto é, o mais alto padrão ético e moral de vida a fim de agradar a Deus, que nos elegeu (Ef 5.1-3).

Nesse sentido, a eleição condicional (daqueles que atendem ao chamado divino) predestina (o destino desses escolhidos) para uma vida afastada do pecado e de conduta ilibada. O uso paulino dos termos “santo e irrepreensível” evidencia que as palavras mutuamente se correspondem e complementam-se. O ser santo denota um estado de pureza interior que reflete no ser irrepreensível
 — uma condição de pureza externa. O apóstolo reitera que fomos “criados em Cristo Jesus para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas” (2.10 NAA). Portanto, não se pode conceber que os salvos em Cristo ainda possam viver na prática do pecado (1 Jo 3.6; 5.18).


4. A nova vida dos eleitos


Deus elegeu-nos e predestinou-nos a viver em santidade. Em consequência, os cristãos são exortados quanto ao trato passado: a despojar-se do velho homem (Ef 4.22), a renovar a mentalidade (4.23) e a revestir-se do novo homem, “que segundo Deus é criado em verdadeira justiça e santidade” (4.24). Essa orientação aponta para a necessidade de uma radical transformação. Despir-se do “velho homem” exige abandonar a velha natureza com as suas paixões, adotar uma nova perspectiva mental e uma nova forma de vida (Cl 3.9-10; Rm 6.6-9). O tema é apresentado com exortações contra a velha conduta, tais como a mentira, o furto, as palavras torpes, a amargura, a ira e a cólera (4.25,28,29,31).

Nessa nova vida, segundo a revelação das Escrituras, o crente salvo deve pautar as suas atitudes segundo a moral bíblica, baseado na integridade, e não de acordo com o contexto social em que se está inserido. Foi nesse diapasão que Paulo apresentou o primeiro contraste entre a nova e a velha vida: “Pelo que deixai a mentira e falai a verdade cada um com o seu próximo” (4.25). Esse ponto é nevrálgico para o autêntico cristão que sempre dirá a verdade, ainda que a mentira possa trazer-lhe alguma vantagem pessoal ou favorecer a coletividade.

Na sequência de orientações para o viver em Cristo, Paulo faz severas advertências contra a prostituição, a impureza, a avareza e a embriaguez (5.3,15,18). O propósito é apresentar a Deus uma “igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga [...], mas santa e irrepreensível” (5.27). Não obstante, ratifica-se que somente o Espírito Santo capacita o crente para esse viver (Gl 5.16-25). Trata- se de um processo contínuo até a glorificação final no dia de Cristo (2 Co 3.18).

Desse modo, um crente fiel não só deve fazer a diferença, como também o seu comportamento deve ser referencial para a sociedade. Como resultado, velhos hábitos são abandonados, condutas reprováveis são descartadas, e nítidas mudanças comportamentais são percebidas. Assim, aqueles que desenvolvem “a nova natureza de Cristo adquirem caráter que não somente perdura, como também transforma”.62

II. PREDESTINADOS PARA SANTIDADE E FILIAÇÃO

1. A predestinação

O termo grego prooridzo, traduzido como predestinação (Ef 1.5a), é formado pelo vocábulo oridzo, que significa “determinar”, e pela preposição pro, que indica algo feito “antes”; ou seja, predestinação literalmente significa “determinar antes”. A Bíblia de Estudo Pentecostal esclarece que a predestinação aplica-se aos propósitos de Deus inclusos na eleição, que a eleição é a escolha feita por Deus, “em Cristo”, de um povo para si mesmo (1.4), e que a predestinação abrange o que acontecerá ao povo escolhido por Deus (1.5).63 Por conseguinte, nossa Declaração de Fé ensina que a predestinação dos salvos é precedida pelo conhecimento prévio de Deus daqueles que, diante do chamamento do evangelho, recebem a Cristo como o seu Salvador pessoal e perseveram até o fim (Rm 8.29,30).

 Esse conceito ratifica que a predestinação não se refere à escolha de alguns para a salvação e de outros para a perdição. Não significa que Deus predestinou alguns para amá-lo e outros para desprezá- lo, ou, na melhor das hipóteses, a ser indiferente a Ele. O ensino onde Deus aleatoriamente salva uns e condena os demais não é coerente com o testemunho bíblico. Nas Escrituras, a salvação — como já enfatizado — é um chamado universal a toda a humanidade (Is 45.21ss; Jo 7.37ss; Ap 22.17).

Não se trata de uma dádiva concedida arbitrariamente para alguns e negada para outros. A salvação é uma bênção disponível a todos que cumprirem a condição de crer em Cristo (Mc 16.16; Jo 17.20; Rm 9.33; 10.11; Fp 1.29; 1 Tm 1.16; 1 Pe 2.6). Isso indica que Cristo morreu por todos e por cada um, todavia nem todos serão salvos, não por um ato arbitrário de Deus, mas por não preencherem as condições divinamente estabelecidas. Deus concedeu ao ser humano o livre-arbítrio; logo, a oferta da salvação pode ser recusada (Jo 7.16,17).

Apesar de sobejarem textos bíblicos acerca dessa verdade, João Calvino, em uma interpretação particular na sua obra A Instituição da Religião Cristã
— conhecida também como Institutas
— define predestinação de forma absolutamente determinista:

 Chamamos predestinação ao decreto eterno de Deus pelo qual determinou o que fazer de cada um dos homens. Porque Ele não os cria com a mesma condição, mas antes ordena a uns para a vida eterna, e a outros, para a condenação perpétua. Portanto, segundo o fim para o qual o homem é criado, dizemos que está predestinado à vida ou à morte.66


Na Bíblia Sagrada, ao contrário da teologia de Calvino67, a predestinação não abrange a condenação eterna de ninguém (2 Pe 3.9). Conquanto eleição e predestinação sejam intrinsecamente ligadas, elas não são a mesma coisa. Outro equívoco da teologia determinista é tratar a predestinação como sendo dupla, isto é, tendo dois lados: a salvação e a condenação. Reiteramos que a Bíblia somente se refere à predestinação em relação aos salvos em Cristo. Conforme assevera Donald Stamps, “a predestinação abrange o que acontecerá ao povo de Deus — todos os crentes genuínos em Cristo.

 Na eleição, Deus definiu como condição o crer em Cristo (eleição condicional); já na predestinação, Deus planejou o destino e as benesses dos crentes em Cristo que atenderam o chamamento divino. No plano divino, a predestinação dos escolhidos, dentre outros, possui três objetivos específicos: (1) Serem filhos por adoção em Jesus Cristo (Ef 1.5); (2) Serem herdeiros com Cristo (1.11); e (3) Serem conforme a imagem de Cristo (Rm 8.29).

 2. Filhos por adoção

 Paulo é o único escritor do Novo Testamento que emprega o termo “adoção” (Rm 8.15,23; 9.4; Gl 4.5; Ef 1.5). A prática da adoção não fazia parte do sistema legal judaico, porém era comum entre os romanos e perfeitamente conhecida entre os gentios. Assim, o apóstolo enfatiza que foi do agrado de Deus predestinar os eleitos a ser adotados como filhos “segundo o beneplácito de sua vontade” (1.5b). Nossa posição é imerecida, contudo aprouve ao Pai fazê-lo assim conforme o seu querer (Mt 11.26). Nessa perspectiva, Matthew Henry apresenta a seguinte compreensão:

 A predestinação se refere às bênçãos para as quais estão destinados [os eleitos], especialmente a benção que nos predestinou para filhos de adoção. Era o propósito de Deus que no devido tempo chegássemos a ser seus filhos adotivos, e dessa forma tivéssemos o direito a todos os privilégios e à herança de filhos [...] O que enaltece essas bênçãos é o fato de serem produto do desígnio eterno.

Essa constatação exalta a misericórdia divina e assinala que a adoção foi motivada pelo “muito amor com que nos amou” (2.4). Assim, noutro tempo, éramos estranhos e inimigos, mas agora somos filhos reconciliados em Cristo (Cl 1.21; Rm 8.17). A respeito desse imensurável benefício espiritual, o Comentário Bíblico Beacon expressa o seguinte:

 O termo filho (uios), que forma parte da palavra adoção, deve ser distinguido do termo criança (teknon). O primeiro dá a ideia de privilégio não de natureza. Para Paulo, nossa filiação não se baseia na relação natural, na qual os homens estão diante de Deus por terem sido criados por ele, mas numa nova relação pela graça efetivada na obra de Cristo. Neste sentido espiritual, adoção para Paulo significa a aceitação na família daqueles que, por natureza, não lhe pertencem.70


 A diferença destacada acima realça o benefício e a regalia desfrutada pelos eleitos, pois Deus não tinha obrigação alguma em adotar pecadores. Assim, a ênfase da adoção para fazer parte da família de Deus repousa no ato de puríssimo amor, boa vontade e desejo divino.

3. Os privilégios da adoção

 Deus criou a humanidade para viver em comunhão com Ele (Gn 1.26). Como o pecado rompeu com essa dádiva, o Pai restaurou-a em Cristo determinando a adoção dos escolhidos (Ef 1.5). Na cultura grega e romana, a adoção civil era um ato voluntário que abrangia os privilégios da herança e obediência ao pai adotivo; por exemplo, “quando uma criança era adotada, o pai natural perdia toda a autoridade sobre ela, enquanto o pai adotivo adquiria controle total sobre o seu novo filho”.  No sentido espiritual, Paulo faz analogia ao filho adotado (cristão), que, sob a autoridade do pai adotivo (Deus Pai), recebe o direito de pertencer à família de Deus, bem como as “riquezas da glória da sua herança” (1.18).


Aprofundando a comparação com a adoção civil, os adotados em Cristo tornam-se “povo de propriedade exclusiva de Deus” (1 Pe 2.9, ARA), eleitos segundo a presciência de Deus Pai para a obediência a Cristo (Rm 6.16; 16.26; 2 Co 10.5; 1 Pe 1.2). Prosseguindo nessa simetria, Deus predestinou aos eleitos às bênçãos de um novo nome e uma nova imagem — a imagem de Cristo (Rm 8.29; Ap 2.17). A redenção e a remissão de pecados são concedidas (1.7,8), e a comunhão é restabelecida com a intimidade de clamar “Aba, Pai” (Gl 4.6). Passamos a ser herdeiros de Deus e coerdeiros de Cristo (Rm 8.17) das promessas a Abraão (Gl 3.29) e da vida eterna (Tt 3.7; Ef 3.6). E, tendo sido aceitos por Deus, fomos transformados em filhos para o seu louvor e glória (Ef 1.6). Nesse aspecto, a abrangência da filiação tem uma dimensão simultaneamente presente e futura:

Essa maravilhosa filiação em Cristo, bem como os benefícios que dela advém, já pode ser desfrutada no tempo presente e será plena por ocasião da segunda vinda do Senhor.72 A condição para fazer parte desse glorioso evento é estar em Cristo. A filiação também abrange deveres com o Pai e com a família de Cristo — a Igreja (Hb 12.7-16).

III. A SUBLIMIDADE DO PROPÓSITO NA PREDESTINAÇÃO

1. Predestinação e salvação

O termo “predestinação” aparece seis vezes no Novo Testamento (At 4.28; Rm 8.29-30; 1 Co 2.7; Ef 1.5,11). Em nenhuma dessas vezes, a expressão faz referência a pecadores sendo destinados à condenação eterna. Conforme anota o teólogo Titillo, “tal observação deveria ser suficiente para desmontar a compreensão calvinista da predestinação como a escolha de uns indivíduos para a salvação e de outros para a perdição”.73 John Wesley, na sua obra Predestinação Calmamente Considerada, faz objeção à ideia de Calvino da predestinação arbitrária de alguns para a perdição:

A respeito daquele que, sendo capaz de livrar milhões da morte apenas com um sopro de sua boca, se recusasse a salvar mais do que um dentre cem e dissesse: “Eu não faço porque não o quero”, como exaltaremos a misericórdia de Deus se lhe atribuirmos tal procedimento?74

Como Deus pode ser considerado um justo juiz se Ele condena o réu previamente? Como pode ser considerado benigno se Ele julga com parcialidade, permitindo que, pelo mesmo erro, uns sejam absolvidos e outros condenados? Dessarte, se existe uma predestinação para condenação, então de que adianta a pregação? Nesse sistema, os que não são escolhidos estão fadados à danação, quer a Palavra seja pregada, quer não. A única resposta plausível, em conformidade com os atributos divinos, está em perceber o equívoco na interpretação de João Calvino e considerar a presença de equidade e igualdade no julgamento dos pecadores.

 Por conseguinte — novamente —, reafirmamos pedagogicamente que predestinação não pode ser considerada dupla, isto é, não está relacionada com a condenação, mas diz respeito somente àqueles que são salvos, sendo condicionada à fé em Cristo Jesus e à presciência divina (1.4,5; 1 Pe 1.2). Essa interpretação está assim expressa no Comentário Bíblico Pentecostal do Novo Testamento:

 “A questão da predestinação não significa Deus decidindo antecipadamente quem será salvo ou não, mas decidindo antecipadamente o que planeja que os eleitos, em Cristo, sejam ou venham a ser”.76

Esse também é o parecer da Declaração de Fé das Assembleias de Deus:

O Soberano Deus não predestinou incondicionalmente pessoa alguma à condenação eterna, mas, sim, almeja que todos, arrependendo-se, convertam-se de seus maus caminhos: “Mas Deus, não tendo em conta os tempos da ignorância, anuncia agora a todos os homens, em todo lugar, que se arrependam” (At 17.30). A predestinação genuinamente bíblica diz respeito apenas à salvação […] A predestinação do crente leva-o a ser conforme a imagem de Cristo (Rm 8.29-30), assim sendo, todos somos exortados a perseverar até o fim: “aquele que perseverar até ao fim será salvo” (Mt 24.13).77


Diante dessas exaustivas citações e reiteradas afirmações quanto ao conceito bíblico da eleição e da predestinação, os salvos em Cristo devem resistir e fazer objeção a qualquer ensino contrário à revelação contida nas Escrituras Sagradas. Os dogmas elaborados pelo pensamento humano não podem sobrepor-se, em hipótese alguma, à autoridade da Palavra de Deus.

 2. A predestinação e o amor

Antes da criação de qualquer coisa, o plano divino de redimir a humanidade e definir o destino dos crentes já estava estabelecido (1.4,5). Por conseguinte, a redenção não foi uma medida emergencial; pelo contrário, esse era o plano imutável do amor de Deus desde sempre (2 Ts 2.13; 2 Tm 1.9). Por conseguinte, a sublimidade dos propósitos eternos em prover a salvação está no amor de Deus (Jo 3.16; 1 Jo 4.10,19). Acerca desse amor presente tanto na eleição quanto na predestinação, o Comentário do Novo Testamento
— Aplicação Pessoal registra o seguinte:

A generosidade de Deus para conosco é concretizada pela nossa união com o seu muito amado Filho. Podemos dizer que o amor de Deus por seu único Filho o motivou a ter muito mais filhos
 — cada um dos quais seria igual a seu Filho (Rm 8.28- 30), por estarem em seu Filho e por serem moldados à sua imagem.78

Foi por amor que fomos eleitos por Deus e predestinados em Cristo (Rm 8.29; Ef 1.4,5). Isso implica dizer que o “favor imerecido”, a fé necessária para crer e o uso do livre-arbítrio para responder ao chamado, tudo isso provém do amor de Deus (2.4,8). Não obstante, os que se achegam a Cristo não são coagidos, mas atraídos a Ele (Jo 12.32).

                                                      A igreja eleita
                                                  -Douglas Baptista 

                         A eleição e a predestinação segundo o eterno propósito de Deus ...

                      3. ESCOLHIDOS PELO PAI — 1.4-6

3.1. O sentido das palavras "eleger" e "escolher" — v. 4 Nessa passagem temos a participação do Pai celestial na nossa redenção, como o texto mesmo indica: "... nos elegeu nele antes da fundação do mundo". As palavras eleger e escolher têm o mesmo sentido. A forma do verbo escolher no grego está no passado, e o significado literal da expressão "nos elegeu (escolheu) nele" dá uma idéia mais forte, que é: "escolheu-nos para si mesmo". Doutra forma, o Pai nos "elegeu em Cristo ("nele") para sermos seus.

3.2. A questão do ato soberano de Deus — v. 4 Há quanto tempo Ele nos escolheu? "... antes da fundação do mundo". O ato de escolher-nos antes de todas as coisas revela a presciência de Deus. A questão da presciência divina deu origem à doutrina da predestinação absoluta. Algumas correntes de interpretação têm procurado defender o ato soberano de Deus como capaz de escolher a quem quer, como e quando quer. É claro que o sentido da palavra "escolher" nos obriga a raciocinar, pois o sentido desse vocábulo implica separar uns e deixar outros. Por sua presciência, Deus conhece os que hão de se salvar e os que se perderão. Porém, esse fato não dá direito a nós, objetos ou não dessa eleição, de julgar ou delimitar a ação da soberania de Deus. Entendemos a vontade soberana de Deus para fazer e desfazer, salvar ou deixar de salvar, escolher ou não o que lhe apraz, mas não podemos aceitar a idéia de que Deus possa, por causa de sua soberana vontade, rejeitar um pecador arrependido. A vontade soberana de Deus tem seu princípio na justiça, e a escolha dos crentes é feita segundo a obra expiatória de Cristo Jesus, seu Filho, que cumpriu a justiça exigida para dar oportunidade a todos quantos o aceitam por Salvador e Senhor. Assim como a pregação do Evangelho engloba todas as criaturas na face da terra, também e global o alcance da vontade soberana de Deus na escolha dos salvos. Nossa fé em Cristo e a aceitação de sua obra redentora são a base de nossa eleição. Assim como o povo de Israel foi escolhido em Abraão, os crentes neotestamentários foram escolhidos em Cristo.

3.3. O destino dos crentes feito na eternidade — v. 5 "E nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo". Esse versículo indica que o destino foi determinado antes. A palavra "predestinar" mostra que o destino dos eleitos foi feito na eternidade. A expressão "filhos de adoção por Jesus Cristo" apresenta a posição atual dos crentes. No passado éramos apenas criaturas de Deus, afastadas da sua comunhão, mas pela fé em Cristo (Gl 3.6) fomos recebidos como filhos e conquistamos a posição de filhos legítimos (Jo 1.12).

3.4. Escolhidos para filhos de Deus — v. 5 Fomos feitos filhos de adoção "para si mesmo". Isso revela o passado e o presente dos crentes. Todos fomos feitos e criados para viver em comunhão com Deus, como filhos de Deus (Gn 1.26; At 17.28). Pelo pecado, tal privilégio se perdeu, mas pela graça de Deus, em Cristo e através dEle, fomos restaurados à filiação (Jo 1.12). Esse ato divino foi feito em Cristo segundo "o beneplácito de sua vontade", isto é, a vontade soberana de Deus e o seu grande amor (Rm 5.8) promoveram essa eleição. Todos os que nascem de novo (Jo 3.3) nascem segundo o supremo propósito divino para viver e servir a Deus.

3.5. Escolhidos por causa do Amado — v. 6 "Para louvor e glória da sua graça, pela qual nos fez agradáveis a si no Amado", v. 6. Nesse versículo, a segurança de nossa aceitação como filhos de Deus está no Amado, que é Cristo. Ele é o Filho amado de Deus (Mt 3.17; 17.5), e em Colossenses 1.13 temos uma expressão paralela que afirma ser Jesus "o Filho do seu amor". A graça de Deus se manifestou a nós por causa do seu amado Filho — Jesus!

4. REMIDOS PELO FILHO — 1.7-12

4.1. Jesus, o Redentor — v. 7 A parte da redenção compete ao Filho de Deus, Jesus Cristo. Ele é o nosso Redentor. Para entendermos este assunto devemos conhecer o sentido da palavra redenção, que significa comprar outra vez. Cristo pagou o preço de nossa redenção. Visto que Ele foi o preço dessa redenção, fomos libertados para Deus (Mt 20.28). O homem não pode redimirse por outro meio que não seja a obra expiatória de Cristo. Ser redimido é a necessidade básica que o pecador tem da graça de Deus.

 4.2. O fato da redenção — v. 7 "... em quem temos a redenção". A redenção está ligada à idéia de sacrifício com derramamento de sangue (Lv 17.11; Hb 9.22). A morte de Jesus com o derramamento do seu precioso sangue resultou na remissão de nossos pecados. O efeito da redenção é a nossa justificação (Rm 5.1). Todos os pecados foram expiados pelo sangue de Cristo, como diz ainda o versículo: "... pelo seu sangue, a remissão das ofensas...". A remissão dos pecados foi um ato do amor grandioso de Deus, conforme registra a Escritura em continuação: "... segundo as riquezas da sua graça". O acesso às riquezas da graça de Deus é precedido pela remissão dos pecados, que deve ter ação constante contra os pecados involuntários que cometemos, pois se a pena do pecado foi apagada na cruz, temos agora de vigiar contra o poder do pecado que procura impedir nossa comunhão verdadeira com Deus.

4.3. O efeito da redenção — v. 8 "Que ele fez abundar para conosco". A abundância das "riquezas da sua graça" (v. 7) terá sua efetivação mediante o perdão dos pecados, "em toda a sabedoria e prudência". O sentido dessa expressão indica o pleno conhecimento que todo crente deve ter de si mesmo, de sua salvação, de seu estado moral e de suas relações com Cristo. A forma de vida que adotamos como crentes é que determina a disposição de Deus para que abundemos nas "riquezas da sua graça". A bênção da redenção no verso oito é estritamente divina, sem nenhum mérito humano.

4.4. A revelação do mistério da redenção — v. 9 "Descobrindo-nos o mistério da sua vontade". Qual será esse mistério? Qual é o mistério da sua vontade descoberto hoje? É a salvação eterna em Cristo Jesus, revelada como o "mistério da piedade" (1 Tm 3.16). Esse mistério glorioso "se fez carne" na pessoa de Jesus Cristo (Jo 1.14).

4.5. A dispensação da redenção — v. 10 "... dispensação da plenitude dos tempos". A palavra "dispensação" significa administração. O Novo Testamento emprega essa palavra para referir-se às diferentes administrações das bênçãos de Deus. A Bíblia fala de sete dispensações, e cada uma eqüivale a um período especial em que Deus administrou sua economia na terra. No grego, a palavra "dispensação" é oikonomia e dela deriva a palavra "economia". No uso bíblico, dispensação é a administração divina sobre todas as coisas criadas. O sentido literal é a administração dos assuntos de uma casa.

 4.6. A plenitude dos tempos da redenção — v. 10 "Plenitude dos tempos" é uma expressão que indica o fim de uma época ou de um período em que Cristo colocará cada coisa no seu lugar, e tudo quanto Deus planejou em Cristo, segundo o seu eterno propósito, alcançará completa realização. Nos versículos anteriores, Cristo completou a obra que tinha que fazer em relação à salvação da humanidade; completada toda a obra, Deus Pai reunirá "em Cristo todas as coisas". A expressão "todas as coisas" inclui "tanto as que estão nos céus como as que estão na terra" (Cl 1.16-19) e devem ser reunidas em Cristo. TUDO deve ser renovado e restaurado em Cristo. O sentido da palavra "reunir" é recapitular, ou somar em um, ou unir sob uma cabeça. E o que Deus fará! Um dia Deus juntará em Cristo todos os remidos pelo seu sangue. A redenção efetuada por Cristo inclui o céu e a terra, quando Ele restabelecerá tudo para uma nova vida, um novo reino espiritual e eterno, em que os ímpios e os demônios serão lançados fora da presença de Deus para sempre (Ap 21.8). A expressão "juntará todas as coisas em Cristo" não se limita apenas à Igreja arrebatada, mas refere-se também a todo o universo. A parte final do versículo — "tanto as que estão nos céus como as que estão na terra" — inclui toda a criação. Homens e anjos, absolutamente tudo há de encontrar seu fim no grande vitorioso: JESUS (Cl 1.15,16).

 4.7. A grande bênção da redenção — v. 11 "Nele, digo, em quem também fomos feitos herança". O direito à herança é alcançado, não por mera casualidade nem por méritos humanos, mas pela graça de Deus, pelo cumprimento do seu propósito, tornando-nos aptos para receber esta gloriosa bênção — "feitos herança" — do Senhor. No Antigo Testamento o povo de Israel era a herança de Deus, mas perdeu esse direito por sua incredulidade. Em seu lugar, isto é, em Cristo, fomos feitos herança sua. O texto indica que nos fez herança dEle, conquistada no Calvário por Ele e para Ele. Agora somos co-herdeiros com Cristo da herança que Deus nos tem preparado na eternidade, segundo o seu eterno propósito.

 4.8. A predestinação no propósito da redenção — v. 11 "... havendo sido predestinados conforme o propósito daquele que faz todas as coisas". A colocação da palavra "predestinação" nesse texto tem dado margem a uma interpretação errada sobre a questão da soberania de Deus. O fato da soberania de Deus é incontestável, mas o resultado proposto por muitos intérpretes é injusto, pois torna este Deus, soberano em sua vontade, injusto e incoerente com sua própria Palavra. Deus é soberano e faz o que lhe apraz, mas Ele é justo e imparcial, dando a todos os homens a mesma oportunidade. Entretanto, Deus conhece aqueles que lhe servem e os que não querem servi-lo. O significado da palavra "predestinar" é estabelecer o destino antes. Deus estabeleceu o destino de todos os que aceitaram a Cristo como Senhor e Salvador para pertencerem à herança divina. Em Romanos 8.28, a Escritura diz que somos "chamados por seu decreto". O destino dos crentes em Cristo está predestinado automaticamente para a salvação. O livre-arbítrio das pessoas indicará o seu destino escolhido. Na aceitação ou rejeição da obra de Cristo se cumprirá a soberana vontade de Deus. Ele conhece cada ser humano, em todos os tempos, e não se esquece de nenhum detalhe. Conhece os milhões e milhões de corações livres para decidirem sobre suas próprias vidas, e Ele sabe quais e quantas aceitarão sua vontade divina.

4.9. A soberania do conselho da vontade divina na redenção — vv. 11,12 A gloriosa esperança dos crentes está no fato de que Deus fez tudo "segundo o conselho da sua vontade" (v. 11). Esse conselho indica a Trindade constituída do Pai, do Filho e do Espírito Santo decidindo o destino dos homens. As palavras "predestinados", "propósito", "conselho" e "vontade" estão em íntima relação e mostram claramente toda a soberania de Deus. O fim desse propósito divino revela-se no verso 12, quando diz que alcançamos essas bênçãos "para louvor da sua glória".</
div>


4.10. A promessa da redenção para judeus e gentios — v. 12 As palavras finais do versículo dizem: "... nós, os que primeiro esperamos em Cristo". A quem Paulo está se referindo? Aos judeus, visto que ele mesmo era judeu. A colocação da frase indica o seu estado anterior quando desconhecia a Cristo. Paulo estabelece aqui o contraste entre os judeus e os gentios para mostrar que, tanto uns quanto outros, têm o mesmo direito de posse em Cristo. Por outro modo, Paulo designa os judeus ("nós") que esperavam a promessa da primeira vinda de Jesus (Is 53) quando diz: "... nós, os que primeiro esperamos". Depois, no verso 13, ele se dirige aos gentios convertidos ("vós") que têm recebido o "Espírito Santo da promessa". Portanto, judeus e gentios têm os mesmos direitos e privilégios em Cristo Jesus, nosso Senhor.

                                                               Comentário Bíblico Efésios
                                                                               - Elienai Cabral

 CARTA AOS ROMANOS, CAPÍTULO 9

                   BENÇÃOS PROCEDENTES de DEUS O PAI
                    (Ef 1.4-6)

As estrofes mencionadas no ponto anterior são relacionadas aos aspectos da redenção divina e, ao mesmo tempo, cada estrofe que termina com o estribilho “para o louvor da glória da sua graça” (1.6), “para o louvor da sua glória” (1.12) ou “em louvor da sua glória” (1.14) nos traz os ensinamentos das bênçãos que a obra redentora de Deus nos oferece.

Vejamos, portanto, as bênçãos procedentes do Pai:

Em primeiro lugar, Deus nos escolheu (Ef 1.4). “Como também nos elegeu nele, antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis diante ele.” A eleição é um ato da livre e soberana graça de Deus. Em momento algum Paulo trata da questão da eleição como um tema para discussões frívolas e acadêmicas. Ao contrário, ele entra nesse terreno com os pés descalços, com humildade e reverência. Ele abre esse assunto com doxologia e adoração, dizendo: “Bendito seja o Deus e Pai”. A Bíblia nunca argumenta a doutrina da eleição; simplesmente a põe diante de nós. Francis Foulkes tem razao quando diz que a doutrina da eleição não é levantada como um assunto de controvérsia ou de especulação.'52

Concordo com John Stott quando diz que a doutrina da eleição não foi inventada por Agostinho de Hipona nem por Calvino de Genebra. Pelo contrário, é, sem dúvida, uma doutrina bíblica, e nenhum cristão bíblico pode ignorá-la.-’3 A Bíblia não só não discute o tema, mas nos proíbe de discutí-lo: “Ele [Deus] tem misericórdia de quem quer e endurece a quem quer. Então me dirás: Por que Deus se queixa ainda? Pois, quem pode resistir à sua vontade? Mas quem és tu, ó homem, para argumentares com Deus? Por acaso a coisa formada dirá ao que a formou: Por que me fizeste assim?” (Rm 9.18-20).

Dr. Gambreil, presidente da Convenção Batista do Sul de 1917 a 1920, disse que grandes reavivamentos têm resultado da pregação heróica das doutrinas da graça, pois Deus honra a pregação que o honra. Diz ele: “Vamos trazer artilharia pesada do céu e trovejar contra essa nossa época presunçosa, como fizeram Whitefield, Edwards, Spurgeon e Paulo, e os mortos receberão vida em Cristo”.

As provas bíblicas acerca da eleição divina são incontestáveis. Charles Spurgeon diz que, por meio dessa verdade da eleição, fazemos uma peregrinação ao passado e contemplamos pai após pai da igreja, mártir após mártir levantar-se e vir apertar nossa mão.3'’1 Se crermos nessa doutrina teremos atrás de nós uma nuvem de testemunhas: Jesus, os apóstolos, os mártires, os santos, os reformadores, os avivalistas, os missionários. Se crermos nessa doutrina estaremos acompanhados por Jesus, Pedro, João, Paulo, Agostinho, Crisóstomo, Lutero, Calvino, Zuínglio, John Knox, John Owen, Thomas Goodwin, Jonathan Edwards, George Whitefield, Charles Spurgeon, John Broadus, Martyn Lloyd-Jones, John Stott e tantos outros. Se crermos nessa doutrina teremos atrás de nós os grandes credos e confissões reformadas. Se crermos nessa doutrina teremos ao nosso lado o testemunho das Escrituras e da história da igreja.

Paulo fala sobre vários aspectos da eleição em O autor da eleição. Deus, o Pai, é o autor da eleição. Não fomos nós quem escolhemos a Deus; foi ele quem nos escolheu (2Ts 2.13; Jo 15.16). Os pecadores perdidos, entregues a si mesmos, não procuram a Deus (Rm 3.10,11); Deus, em seu amor, é quem procura os pecadores (Lc 19.10). Deus não nos escolheu porque previu que creríamos em Jesus; ele nos escolheu para crermos em Jesus (At 13.48). Deus não nos escolheu por causa da nossa santidade, mas para sermos santos e irrepreensíveis (1.4). Deus não nos escolheu por causa das nossas boas obras, mas para as boas obras (2.10). Deus não nos escolheu por causa da nossa obediência, mas para a obediência (IPe 1.2). A fé, a santidade, as boas obras e a obediência não são a causa, mas o resultado da eleição. A causa da eleição divina não está no objeto amado, mas naquele que ama. Deus nos escolheu não por causa dos nossos méritos, mas apesar dos nossos deméritos. A eleição divina é incondicional.

O tempo da eleição (1.4). Spurgeon dizia que enquanto não recuarmos até ao tempo em que o Universo inteiro dormia na mente de Deus como algo que ainda não havia nascido, enquanto não penetrarmos na eternidade em que Deus, o Criador, vivia na comunhão da Trindade, quando tudo ainda dormia dentro dele, quando a criação inteira repousava em seu pensamento todo abrangente e gigantesco, não teremos nem começado a sondar o princípio, o momento em que Deus nos escolheu. Deus nos escolheu quando o espaço celeste não era ainda agitado pelo marulhar das asas de um único anjo, quando ainda não existia qualquer ser, ou movimento, ou tempo, e quando coisa alguma nem ser nenhum, exceto o próprio Deus, existia, e ele estava sozinho na eternidade.35

A eleição divina não foi um plano de última hora porque o primeiro plano de Deus fracassou. O pecado de Adão não pegou Deus de surpresa. Deus não ficou roendo as unhas com medo de o homem estragar tudo no Éden. Deus planejou a nossa salvação antes mesmo de lançar os fundamentos da terra. Antes que houvesse céu e terra, Deus já havia decidido nos escolher em Cristo para a salvação. Ele nos escolheu antes dos tempos eternos (2Tm 1.9). Ele nos escolheu desde o princípio para a salvação (2Ts 2.13). Ele nos escolheu antes da fundação do mundo (1.4).

 Esse plano jamais foi frustrado nem anulado. Mesmo diante da nossa rebeldia e transgressão, o plano de Deus permanece intato e vitorioso. Paulo diz: “E os que predestinou, a eles também chamou; e os que chamou, a eles também justificou; e os que justificou, a eles também glorificou” (Rm 8.30). Nenhum problema neste mundo ou no mundo por vir pode cancelar essa eleição divina. Paulo pergunta: “Quem trará alguma acusação contra os escolhidos de Deus? É Deus quem os justifica; quem os condenará? Cristo Jesus é quem morreu, ou, pelo contrário, quem ressuscitou dentre os mortos, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós” (Rm 8.33,34). O apóstolo ainda diz: “Aquele que começou a boa obra em vós irá aperfeiçoá-la até o dia de Cristo Jesus” (Fp 1.6). Nossa vida está segura nas mãos de Jesus, e das suas mãos ninguém pode nos tirar (Jo 10.28). O agente da eleição (1.4). Deus nos escolheu em Cristo. A eleição não anula a cruz de Cristo; antes, a inclui. Não somos salvos à parte de Cristo e de seu sacrifício vicário, mas através de sua morte substitutiva. A eleição é o fundamento e a raiz de todas as bênçãos subsequentes.36 Deus não nos escolheu em nós mesmos, por nossos méritos, mas em Cristo. A parte de Cristo não existe eleição. Todas as bênção espirituais que recebemos estão centralizadas em Cristo. Ninguém pode se considerar um eleito de Deus mantendo-se ainda rebelde a Cristo.

O objeto da eleição (1.4). “[Deus] nos elegeu” (grifo do autor). Isso prova que a salvação não é universalista. Paulo está escrevendo aos crentes (1.1) e aos santos e irrepreensíveis (1.4). Esse “nos” refere-se a todos os homens sem distinção (etnia, cultura, religião), mas não a todos os lioinens sem exceção. Karl Barth afirma erroneamente que, em conexão com Cristo, todos os homens, sem exceção, são eleitos e que a distinção básica não é entre eleitos e não eleitos e, sim, entre os que têm consciência de sua eleição e os que não a têm.37

O propósito da eleição. Deus nos escolheu em Cristo para “sermos santos e irrepreensíveis” (1.4). A santidade e a irrepreensibilidade são o propósito de Deus na eleição. Nenhuma pessoa deve considerar-se eleita de Deus se não vive em santidade. A santificação não é a causa, mas a prova da nossa eleição. A eleição é a raiz da salvação, não seu fruto! Vejamos com mais detalhe os propósitos da eleição.

 A santidade (1.4). Enganam-se aqueles que pensam que a doutrina da eleição promove e estimula uma vida relaxada. Somos eleitos para a santidade, e nao para o pecado. Somos salvos do pecado, e não no pecado. Jesus se manifestou para desfazer as obras do diabo (IJo 3-8). Uma pessoa que se diz segura de sua salvação e nao vive em santidade está provando que não é eleita. A Bíblia diz que devemos confirmar a nossa eleição. William Barclay afirma corretamente que a palavra grega hagios, “santo”, contém sempre a ideia de diferença e de separação, Algo que é hagios é diferente das coisas ordinárias. Um templo é santo i porque é diíeren íifícios. Um sacerdote é santo porque é c ;m comum; uma vítima i é santa porque é ;mais animais; o dia do i repouso é santo porque ê diferente dos demais dias. Deus é j santo por excelência porque é diferente dos homens. Assim, j Deus escolhe o cristão para que seja diferente dos demais ; homens.

Muitos, para sua própria ruína, pervertem a doutrina da eleição quando afirmam “Sou um eieito de Deus” mas se assentam no ócio e praticam a iniquidade com ambas as maos. F. F. Bruce comenta com sabedoria: “O amor de Deus que nos predestina é recomendado mais por aqueles que levam vida santa e semelhante à de Cristo do que por aqueles cuja tentativa de desembaraçar o mistério termina em disputas sobre questões irrelevantes de lógica”.

Aqueles que não são santos não podem ter comunhão com Deus nem jamais verão a Deus. No céu, só entrarão os santos. Uma pessoa que não ama a santidade não suportaria o céu. Spurgeon argumentava: por que você reclama da eleição divina? Você quer ser santo? Então você é um eleito. Mas se você diz que não quer ser santo nem viver urna vida piedosa, por que você reclama por não ter recebido aquilo que nao deseja? Curtis Vaughan cita a conhecida a advertência de Spurgeon aos seus ouvintes: Ninguém poderá julgar-se eleito dc Deus a menos que tenha a convicção de estar em Cristo. Não imagineis que alguma espécie de decreto firmado no mistério da eternidade salve as vossas almas, a menos que creais em Cristo. Não imagineis que sereis salvos mesmo que não tenhais fé. Essa é a mais abominável e maldita heresia que tem arruinado milhares. Não tomeis a eleição divina como uma espécie de travesseiro para dormirdes sossegado, porque podereis perder-vos.39


A irrepreensibilidade (1.4). A palavra grega amomos, “Irrepreensível”, é a palavra veterotestamentária para um sacrifício imaculado.40 Essa palavra quer dizer “sem qualquer espécie de mancha”. Era a palavra usada para um animal apto para o sacrifício perfeito. William Barclay diz corretamente que a palavra amomos concebe toda a vida e todo o homem como uma oferenda a Deus. Cada parte da nossa vida, nosso trabalho, nosso lazer, nossa vida familiar, nossas relações pessoais deve fazer parte da nossa oferenda a Deus.

 A eleição tem como alvo nos levar a uma vida limpa, pura, santa. Somos a noiva do Cordeiro que está se adornando para ele. Não somos escolhidos para viver na lama, mas para viver como luzeiros do mundo e apresentar-nos a Jesus como a noiva pura, santa e sem defeito (5.27).

A comunhão com Deus (1.5). “E nos predestinou para si mesmo.” Deus nos predestinou para ele, para vivermos diante dele. Deus não nos escolheu para vivermos longe dele, sem intimidade com ele, sem comunhão com ele. Fomos eleitos para Deus, para andarmos com Deus, para nos deleitarmos em Deus. Ele é a nossa fonte de prazer. Ele é o amado da nossa alma. Na presença dele é que encontramos plenitude de alegria (Sl 16.11).

Podemos concluir dizendo que a doutrina da eleição é uma revelação divina, e não uma especulação humana; ela é um incentivo à santidade, e não uma desculpa para o pecado; é um estímulo à humildade, e não um motivo para o orgulho ; é u m encorajamento à evangelização, e n ã o u m a razão para o descuido missionário.

Em segundo lugar, Deus nos adotou (1.5b). “Segundo a boa determinação de sua vontade, para sermos filhos adotivos por meio de Jesus Cristo.” No mundo romano, a família baseava-se no regime patria potestas, ou seja, o poder do pai. Sob a lei romana, o pai possuía poder absoluto sobre seus filhos enquanto estes vivessem. Podia vendê-los, escravizá-los e até mesmo matá-los. O pai tinha direito de vida e de morte sobre os filhos. A adoção consistia em passar de um patria potestas para outro. O filho adotiva ganhava uma nova família, passava a usar o nome do novo pai e herdava seus bens. Essa adoção apagava o passado e iniciava uma nova relação.42 Deus escolheu-nos e destinou-nos para sermos membros de sua própria família. A eleição da graça outorga a nós não apenas um novo nome, um novo status legal e uma nova relação familiar, mas também uma nova imagem, a imagem de Cristo (Rm 8.29).

A adoção é algo lindo. Um filho natural pode vir quando os pais não esperam ou até mesmo quando não querem ou ainda não se sentem preparados. Mas a adoção é um ato consciente, deliberado e resoluto de amor. É uma escolha voluntária. Na lei romana, os filhos adotivos desfrutavam dos mesmos direitos dos filhos legítimos. Um filho adotivo recebe o nome da nova família e torna-se herdeiro natural dessa família. Somos filhos de Deus. Recebemos um novo nome, uma nova herança. Francis Foulkes tem razão quando afirma que um filho adotado deve sua posição à graça, e não ao direito.43 Deus nos predestinou para sermos conformes à imagem de seu Filho (Rm 8.29). O interesse divino é que sejamos transformados em réplicas, imagens de Jesus Cristo e retratos vivos dele.44

Mas somos ainda filhos gerados por Deus. Somos O 1 nascidos do alto, de cima, do céu, do Espírito. Somos coparticípantes da natureza divina. Deus nos escolheu para vivermos como filhos amados. “O próprio Espírito dá testemunho ao nosso espírito de que sormos filhos de Deus” (Rm 8.16).

Em terceiro lugar, Deus nos aceitou (1.6). “Para o louvor da glória da sua graça, que nos deu gratuitamente no Amado.” Não podemos fazer a nós mesmos aceitáveis a Deus. Nossa justiça é como trapo de imundícia aos seus olhos. Mas ele, por sua graça, fez-nos aceitáveis em Cristo. “Cristo habita para sempre no amor infinito de Deus, e como estamos em Cristo, o amor de Deus para com Cristo está em nós de uma maneira maravilhosa.” Quando o filho pródigo chegou em casa com as vestes rasgadas e sujas da lama do chiqueiro, seu pai o abraçou e o beijou e lhe deu nova roupagem! Ele se tornou aceitável ao pai. É como se alguém tomasse um leproso e o transformasse num jovem radiante.

Bênçãos procedentes de Deus, o  Filho (1.7-12)

Todas as bênçãos que recebemos do Pai, recebemo-las em Cristo. Somos abençoados nele. Paulo destaca quatro bênçãos gloriosas procedentes de Jesus Cristo. Aqui a atenção é desviada do céu para a terra, do passado para o presente e, em certo sentido, do Pai para o Filho:

 Em primeiro lugar, Jesus nos redimiu (1.7a). “Nele temos a redenção, [...] pelo seu sangue.” William Barclay diz que a palavra apolytrosis, “redimir”, era usada para o resgate do homem feito prisioneiro de guerra ou escravo. Ela aplica-se também à libertação do homem da pena de morte merecida por algum crime. É a palavra que se usa para se referir à libertação divina dos filhos de Israel da escravidão do Egito, assim como o resgate contínuo do povo eleito em tempo de tribulação. Em cada caso, o homem é redimido e libertado de uma situação de que era incapaz de se libertar por si mesmo ou de uma dívida que jamais poderia pagar por seus próprios meios.

 A palavra redimir quer dizer “comprar e deixar livre mediante pagamento de um preço”. Foulkes diz que a ideia fundamental de “redenção” é de tornar livre uma coisa ou pessoa que se tornara propriedade de outrem. Na época de Paulo, o Império Romano tinha cerca de 60 milhões de escravos, e eles, geralmente, eram vendidos como uma peça de mobília. Mas um homem podia comprar um escravo e dar-lhe liberdade. Foi isso que Cristo fez por nós.“’0 O preço da nossa redenção foi o seu sangue (1.7; IPe 1.18,19). Isso quer dizer que estamos livres da lei (G1 5.1), da escravidão do pecado (Rm 6.1), do mundo (G1 1.4) e do poder de Satanás (Cl 1.13,14).

 Em segundo lugar, Jesus Cristo nos perdoou (1.7b). “O perdão dos nossos pecados [...], segundo a riqueza da sua graça.” O verbo perdoar quer dizer “levar embora”. Cristo morreu para levar nossos pecados embora a fim de que nunca mais sejam vistos. Não há qualquer acusação registrada contra nós, pois nossos pecados foram levados embora/1 O nosso perdão é baseado no sacrifício expiatório de Cristo. O perdão de Cristo é completo. Ele morreu para remover a culpa do nosso pecado. Ele é o Cordeiro que tira o pecado do mundo (jo 1.29). Agora nenhuma acusação pode prosperar contra nós, porque Cristo já rasgou o escrito de dívida que era contra nós (Cl 2.14). Ele perdoou-nos, e dos nossos pecados jamais se lembra. O perdão de Cristo é imerecido, imediato e completo.

Em terceiro lugar, Jesus Cristo nos revelou a vontade de Deus (1.8-10). O apóstolo Paulo escreve:

Que ele [Deus] fez multiplicar-se para conosco em toda sabedoria e prudência. E fez com que conhecêssemos o mistério da sua vontade, segundo a sua boa determinação, que nele [Cristo] propôs para a dispensação da plenitude dos tempos, de fazer convergir em Cristo todas as coisas, tanto as que estão no céu como as que estão na terra ( 1.8- 10).

Deus não apenas recebe e perdoa àqueles que ele reconciliou consigo mesmo como filhos; ele também os ilumina com a compreensão do seu propósito. Sua graça é derramada sobre nós em toda a sabedoria e prudência (1.8). A palavra grega sophia, “sabedoria”, é o conhecimento que olha para o coração das coisas, que as conhece tal como realmente são, e phronesis, “prudência”, é a compreensão que leva a agir corretamente. Como William Barclay diz: “Cristo outorga aos homens a habilidade de ver as grandes venturas da eternidade e de resolver os problemas de cada instante”. Os homens têm essa sabedoria e prudência porque Deus revela o mistério da sua vontade. Esse mistério é a maneira pela qual Deus traz a uma unidade restaurada o Universo inteiro, que se tornara desordenado devido à rebelião e ao pecado do homem.

 O pecado separou o homem de Deus, do próximo, de si mesmo e da própria natureza. O pecado desintegra, rasga e separa todas as coisas; mas, em Cristo, Deus juntará todas as coisas na consumação dos séculos. Nós somos parte desse grande plano de Deus. John Mackay tem razão quando diz que Deus constituiu a Jesus Cristo como centro unificador de um vasto esquema de unidade por meio do qual as ordens celestes e terrestres, separadas como estão agora por um grande abismo entre o sobrenatural e o natural e pelo abismo ainda maior do santo e do pecaminoso, serão de novo reunidas em uma única e unida comunidade.

 Francis Foulkes diz que a palavra grega anakephalaiosasthai, “fazer convergir”, era usada no sentido de juntar várias coisas e apresentá-las como uma só. O plano de Deus para a plenitude dos tempos, quando o tempo voltar a fundir-se na eternidade, é fazer convergir nele (em Cristo) todas as coisas, tanto as do céu como as da terra (1.10). No tempo presente, ainda há discórdia no Universo, mas, na plenitude do tempo, esta cessará, e aquela unidade pela qual ansiamos virá com o domínio de Jesus Cristo.

 Uma grande questão deve ser aqui levantada. Quais são essas “todas as coisas” que convergirão em Cristo e estarão debaixo de Cristo como cabeça? Será que Paulo estaria insinuando uma salvação universal? Não, absolutamente não. Com certeza, elas incluem os cristãos vivos e os cristãos mortos, a igreja na terra e a igreja no céu. Ou seja, os que estão em Cristo agora (1.1) e que em Cristo receberam bênção (1.3), eleição (1.4), adoção (1.5), graça (1.6) e redenção (1.7). Parece também que Paulo está se referindo à renovação cósmica, à regeneração do Universo, à libertação da criação que geme. Por essa razão, Francis Foulkes diz que é uma heresia de nossa época dividir a vida em sagrada e secular. Cristo está relacionado com todas as coisas, e todas acharão seu verdadeiro lugar e unidade nele.

 Em quarto lugar, Jesus Cristo nos fez herança (1.11,12). “Nele também fomos feitos herança, predestinados conforme o propósito daquele que faz todas as coisas segundo o desígnio da sua vontade, a fim de sermos para o louvor da sua glória, nós, os que antes havíamos esperado em Cristo.” Em Cristo, temos uma linda herança (IPe 1.1- 4) e também somos uma herança. Aqueles que são porção de Deus têm sua herança nele.59 Somos valiosos nele. Pense no preço que Deus pagou por você para que fosse herança dele. Deus, o Filho, é o dom de Deus, o Pai, para nós. E somos o dom do amor de Deus para o Filho. Somos a herança de Deus, o corpo de Cristo, o seu edifício, a sua noiva, a menina dos olhos de Deus, a delícia de Deus. O povo de Deus são os santos de Deus (1.1), a herança de Deus (1.11) e a possessão de Deus (1.14).

                                    Efésios — Igreja, a noiva gloriosa de Cristo

Nenhum comentário:

Postar um comentário